“Ficava um monte de moleques parados, olhando um para a cara do outro”
A gente não podia jogar futebol. Ligar rádio nem pensar. Todo mundo tinha que ficar quietinho em sinal de respeito. No dia mais triste do ano, a gente se limitava a ficar sentado na varanda esperando o passar das horas, torcendo para que elas fossem embora rapidamente. Era um tédio, mas fazer o que? Afinal, Cristo tinha sido crucificado, morto e sepultado. Às 3 da tarde, então, aí que o dia ficava mais tenso. Foi nesta hora, a chamada hora santa, que ele morreu.
Na rua que eu morava, só tinha famílias católicas e, ressaltando, a maioria fervorosamente católica. Por isso, ficava aquele monte de moleques parados, olhando um pra cara do outro. Os pais, ou seria melhor e mais justo dizer, as mães passavam este ensinamento para seus filhos: na Sexta feira Santa não se trabalhava e não se divertia.
O comércio ficava todo fechado. Inclusive os bares. Nada de cachaça ou cerveja. Algumas rádios saíam do ar. Em cartaz nos cinemas A Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. A gente sempre era obrigado a ir. Sem brincadeira, devo ter assistido pelo menos umas nove vezes. Gostava da cena do Cirineu dando uma força para Jesus subir no Monte Calvário. Ele viu que a cruz era pesada demais e que o Mestre estava bastante debilitado para carregá-la. Um simbolismo que atravessa gerações: o irmão ajudando o irmão. Até hoje quando alguém vai ajudar um outro diz: “Vou te ajudar a carregar esta cruz”. A cruz era um baita problema para Cristo e aí surge um anônimo para colaborar. Reparou que muitas vezes a gente acaba recebendo ajuda de quem menos imaginamos?
Moleque, me mandaram para um seminário. Ali que eu senti realmente a dimensão da Sexta-feira Santa para os católicos. Se na quaresma as atividades se restringiam às aulas e trabalhos de limpeza, pense como era a Semana Santa. Agora, imagine como era a Sexta-feira Maior. Você não podia abrir a boca. Nem falar um “oi” para o colega do lado. Éramos uns 200 internos. Às 6 da manhã espalharam a gente pelos extensos bosques de propriedade do seminário.
Munidos de terços, os maiores com a bíblia, e os pirralhos com um livro sobre a história de algum santo, caminhávamos isoladamente. Confesso que sempre tive grandes dificuldades para concluir um terço e naquela época então... Lembro que os padres ficavam vigiando a gente. Na frente deles ficávamos de cara amarrada. Longe, caíamos na gargalhada. Depois do almoço, bastante frugal, inclusive alguns jejuavam, que não era o meu caso, adivinha para onde íamos? Se você disse que iríamos para a cidade assistir A Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo acertou na mosca.
Acho que de tanto assistir aquele filme em preto e branco não consigo imaginar a vida de Cristo em cores. Não consigo ver colorida aquela multidão no sermão da montanha nem outra tonalidade que não seja o cinzento no Seu sofrimento nas oliveiras. Outros filmes foram feitos, mas nenhum manteve a magia do primeiro. O Titanic pode ficar bastante tempo em cartaz, mas duvido que leve pelo menos 10% da Paixão de Cristo.
O mundo cristão mudou os hábitos. Se eu disser para o meu filho não ligar a televisão hoje, vai achar que estou maluco. O comércio não fecha no geral, as pessoas aproveitam o feriado prolongado para viajar, a molecada vai fazer tudo menos ficar parada olhando um para a cara do outro. E não é por isto que eles sejam menos cristãos ou que nós nos tornamos indiferentes. Questão de época. Hoje não vou assistir A Paixão de Cristo, mas vai ser impossível não lembrar do Cirineu colaborando com Cristo na subida, a Verônica segurando o pano com a imagem Dele, a Santa Ceia, as chibatadas, a crucificação. De um jeito ou de outro, aquele Cristo da minha infância me acompanha.
(Do livro de Antonio Roberto de Paula, “Da Minha Janela”, de 2003. Textos publicados no Jornal do Povo a partir de 1997)
Meados de 1958. Manoel Tavares (diretor de “A Tribuna de Maringá”), parou diante de minha casa montado numa motocicleta e armado de máquina fotográfica. Pediu-me que subisse à garupa e o acompanhasse numa visita sem aviso prévio a uma instituição então conhecida como “albergue noturno”, que funcionava em Maringá por conta de um órgão do estado, o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural
“Homenageou um santo e para não ficar muito carola tascou um nome pagão na sequência”
Nasci Antonio como poderia ser João ou Pedro. O parto aconteceu entre Santo Antonio e São João, entre fogos de artifício e bandeirinhas coloridas. Feliz de quem nasce em junho. Pega carona nas festas juninas e recebe benção tripla. A benção do triunvirato Antonio, João e Pedro.
Verdelírio Barbosa começou a escrever em 1959 num jornal chamado O Diário de Maringá, de propriedade de João Antonio Corrêa Júnior, o Zitão, jornalista e escritor já falecido. O jornal, homônimo daquele que viria a ser lançado em 1974, era diário só no nome. Em dificuldades financeiras, circulava uma vez por semana, às vezes nem isso. (Antonio Roberto de Paula Pelo que sei, tinha vindo do norte. Não sei qual norte. Ou seria do sul? Que era corintiano até a raiz, transferência da paixão que vinha do bisavô, mas nunca chutara uma bola. Gostava de cerveja aos domingos e nos outros dias da semana também. Sei que gostava de mulheres. Isso mesmo, no plural. De todas as cores, idades, vocações e tamanhos. No final, sossegou.
A entrada no jornalismo aconteceu depois que Verd
“Quilômetros de papel e rios de tinta imprimem o futebol ao longo dos anos, atravessando gerações. Na era digital, as Imagens avançam pelos céus, rompem todas as fronteiras. As vozes do amor ao futebol ecoam pelo grande campo que é o mundo. Agora, em algum lugar, alguém chuta uma bola. A paixão mais documentada da história não para. O jogo nunca termina.”
(Antonio Roberto de Paula)
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