Crônicas / Copa do Mundo de 1998 (Democracia da paixão)

“O relógio vai avançar preguiçosamente. A gente vai ver, ouvir e ler, mas sem prestar atenção. Só ficar pensando como será esta decisão”

        Hoje eu vou colocar aquela camisa amarela da Copa de 86, o shortão verde e uma fita com a inscrição “Brasil penta”. A bandeira brasileira de plástico, brinde do posto, vai ficar, como sempre ficou, desde a estréia com a Escócia, do lado da televisão. Daqui a pouco vou ligar o rádio para ouvir as entrevistas dos jogadores, do técnico e dos torcedores. Quero acompanhar pela TV todos flashes direto de Paris ou de qualquer canto do Brasil.

    Enquanto meus olhos e ouvidos estiveram ocupados, em sintonia com a seleção, minhas mãos vão estar folheando os cadernos de esporte dos jornais. Quero saber tudo o que está acontecendo. Não é sempre que a gente vai para uma final de Copa do Mundo. Nas 15 copas disputadas nestes 68 anos, fomos para as cabeças em seis. Portanto, hoje é um dia muito especial na vida de quem ama o futebol.

   O país está todo mobilizado para este jogo. Uma hora destas, a carne já está no fogo e as latas e garrafas de cerveja estão prestes a ser abertas. Até o momento da bola começar a rolar a inquietação será das maiores. O relógio vai avançar preguiçosamente. A gente vai ver, ouvir e ler, mas sem prestar atenção. Só ficar pensando como será esta decisão. Temos time para ser campeão? A França vai se superar? O juiz vai meter a mão? Será que o Ronaldinho marca dois e vira artilheiro da Copa?

   Tantas perguntas que gostaríamos que fossem previamente respondidas... A seleção mexe tanto com a gente num dia como o de hoje que chegamos a dar uma pausa nas preocupações. Amanhã, a vida toma seu curso normal, mas hoje... Hoje eu quero ver o Júnior Baiano dar bico para todos os lados, o Dunga comandar a equipe e o Ronaldinho e o Rivaldo fazer gols nos franceses. Contas a pagar eu vou ter a vida inteira, mas chegar numa final de copa é uma vez ou outra.

   Hoje eu estou tão tenso e vou ficar tão feliz se o Brasil for penta que não vou nem ligar para a coleção de abobrinhas que o Galvão Bueno vai nos despejar, para os comentários ridículos do Pelé, Rivelino e Raul Plasman, para o 0900 do Luciano do Vale, para a obviedade dos repórteres. Não vou reclamar nem um pouco quando aparecerem õs pais mães, mulheres, filhos, amigos e cachorros dos jogadores. Muito pelo contrário, vou até ficar emocionado. Coisa brega e linda aquela de mostrar fotos em preto e branco do craque na infância e entra a mãe dizendo que ele fazia muitas artes. E termina a matéria com velhinha choramingando e aquela voz “Brasillll”.

   Vale tudo hoje, meu amigo-leitor-torcedor. Está chegando a hora. Estamos concentrados desde sexta-feira esperando a França, depois daquela histórica vitória sobre os laranjas. Hoje o país se vestiu de verde-amarelo para exercitar a maior paixão popular. A seleção bate bola nas telas do Brasil, entre os mais humildes e os mais abastados. É a paixão democratizada instalada em todos nós. Amanhã é outro dia. Hoje eu só quero ser feliz.

O Brasil perdeu a final para a França por 3 a 0. 

(Do livro de Antonio Roberto de Paula, “Da Minha Janela”, de 2003. Textos publicados no Jornal do Povo a partir de 1997)

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