Crônicas / Pobres crianças sem possibilidade de escolha

“João foi de Alberto porque é trissílabo. Achou Carlos fraco diante daquele prenome forte e estranho: Renailton”

   Renailton odeia seu nome. Sua mãe gostava das crianças de uma vizinha, o Renato e o Ailton. O pobre Renailton é quem acabou pagando o pato com a homenagem. Está com 27 anos e até agora não se acostumou com o nome Renailton Alberto da Luz. O Alberto foi o pai quem colocou. Em 1970, qualquer criança que nascia numa família em que o pai era apaixonado por futebol lá vinha o nome de um dos heróis do tri. Hoje a gente conhece várias pessoas que se chamam Gerson, Everaldo, Marco Antônio, Jair, Wilson, Clodoaldo a até Rivelino, que de sobrenome virou nome.

   Santista doente, literalmente doente. Pelo Peixe e pela fragilidade dos órgãos que o levou para o túmulo dois anos após o nascimento de Renailton, João queria porque queria colocar o nome do garoto de Carlos Alberto. Achava pomposo e mais ainda: seria a perfeita homenagem a Carlos Alberto Torres, o capitão do tri, o lateral-direito santista que levantara a taça e fizera um gol antológico: aquela roladinha do Pelé no bico direito da gande área. O capitão acertou um canudo cruzado que o goleiro italiano, Albertosi, pulou só para sair com estilo na fotografia. Aos 42 minutos do segundo tempo. Brasil 4 a 1. Ali João definiu que seu primeiro rebento se chamaria Carlos Alberto da Luz.

   João definiu, mas era a patroa que mandava. Para não deixar o marido chateado juntou Renato a Ailton transformando-os em um só nome, abrindo espaço para o segundo. Aí tanto poderia entrar Carlos como Alberto. João chegou a sugerir que o menino chamasse Renailton Carlos Alberto da Luz. Quase apanhou. A mulher lhe deu uma das opções: Ou Carlos ou Alberto. João foi de Alberto porque é trissílabo. Achou Carlos fraco diante daquele prenome forte e estranho: Renailton.

   Renailton se martiriza com o nome. Todos se acostumam depois de algum tempo, menos ele. Já se apresentou como Renato, Ailton, Rena. Ilton, mas nenhum vingou. O pessoal insiste em chamá-lo pelo nome completo. Ele se conforma ao imaginar como seria seu nome se os filhos da vizinha se chamassem Nelson e Florisvaldo. Seria Florisnelson ou Nelsonvaldo? E se em vez de Carlos Alberto seu pai fosse fã do Tostão? Seu nome seria Renailton Tostão da Luz?

   Fã daquele time de 94, que conquistou o tetra, Renailton pretende homenagear alguns daqueles craques colocando seus nomes no primeiro filho que está para nascer. Puxou o pai no fanatismo pelo futebol e pelo Santos. Do time titular, não tinha nenhum santista e por isso deve optar por Romário, Jorge, Aldair, Márcio e Mauro. Dunga, Zinho e Mazinho nem pensar. Não quer que o filho sofra o vexame de ter que carregar um nome esquisito pelo resto da vida. A esposa não está concordando mas o primogênito deve receber o quilométrico nome de Romário Jorge Aldair Márcio Mauro da Luz. O garoto vai ter inúmeras alternativas e Renailton vai poder homenagear meio time.

(Do livro de Antonio Roberto de Paula, “Da Minha Janela”, de 2003. Textos publicados no Jornal do Povo a partir de 1997)

Veja Também

Vamos comemorar nossas conquistas

“Miramos tanto no estilo de vida americano que deveríamos copiar o carinho e o respeito que eles têm por seus ídolos”

 O basquete brasileiro comemorou, no último sábado, dez anos de uma de suas maiores conquistas: a medalha de ouro no Pan-Americano de Indianápolis. O feito se tornou ainda mais grandioso porque o adversário da final eram os Estados Unidos, que nunca haviam perdido em casa em toda a histó

Páginas escritas para a história

     Venho folheando jornais antigos nas últimas semanas. Jornais de 30, 40, 50 anos atrás. Um passeio pela linha do tempo, um retorno para um mundo tão longínquo e tão presente.  Cada folheada, uma história. Fico imaginando onde eu estava e o que estava fazendo no ano em que determinada edição foi publicada. E fico analisando os textos, os termos utilizados, as abordagens cerimoniosas e até ufanistas, os

Armando Nogueira e seu exemplo de humildade

“Repórter não é artista nem notícia. Em todo e qualquer acontecimento ele deve se recolher à sua condição de profissional”

 Armando Nogueira disse, em entrevista à TV Cultura de São Paulo, que o jornalista é apenas um intermediário entre a notícia e o público, nada mais do que isso. O veterano jornalista, que brinca com as palavras com a maestria própri

Glória isolada de um Grêmio de Maringá

“Naquela tarde de 2 de outubro de 1977, o torcedor maringaense comemorava o título sem imaginar que seria o último”

   Falta para o Grêmio no bico da grande área. A equipe maringaense está perdendo para o Coritiba por 1 a 0, no Couto Pereira, na decisão do Campeonato Paranaense de 1977. Itamar cobra a falta. Gol do Galo. Final: 1 a 1. Grêmio campeão. Naquela tarde de 2 de outubro de

 Rua Pioneiro Domingos Salgueiro, 1415- sobreloja - Maringá - Paraná - Brasil

 (44) 99156-1957

Museu Esportivo © 2016 Todos os diretos reservados

Logo Ingá Digital