De junho até hoje, a emoção tem aumentado. No mês do meu aniversário, os vereadores aprovaram o projeto de lei do presidente da Casa, Mário Hossokawa, me concedendo o título de cidadão benemérito de Maringá. O projeto foi sancionado pelo prefeito Ulisses Maia. Aí a Câmara marcou para o dia 30 de agosto, nesta sexta-feira, às 19 horas, a entrega, e como é de praxe, numa sessão solene. Estamos animados, eu a Simone, os familiares. Animados e agradecidos.
De junho até agora, até este exato momento, estou agradecendo pelo título. Estou convivendo com aquela sensação de dúvida sobre o merecimento. Procuro não externar este pensamento para não dizerem que estou buscando confetes ou transmitindo uma fabricada humildade. É uma sensação estranha. Lembro de maringaenses que já receberam o título benemérito e de outros que deveriam ter recebido. Sempre fui muito crítico em relação à destinação de títulos, comendas... Trabalhei 12 anos no Legislativo de Maringá e sempre tive opiniões muito particulares sobre cada agraciado ou agraciada. As opiniões desabonadoras, que não são muitas, ficam guardadas a sete chaves, pelo profissionalismo e o respeito a essas pessoas e seus familiares.
Para mim, um título benemérito representa um reconhecimento da cidade ao cidadão por ele ter feito algo relevante, algo que realmente tenha contribuído para o desenvolvimento da cidade e sua gente, um trabalho realizado em prol do bem comum. Então, agora que vou ser homenageado, procuro me encaixar nisso, não para a aceitação das pessoas, o que já seria ótimo, convenhamos, mas é para que eu me sinta confortável nesta situação de Cidadão Benemérito.
Quando examino meu currículo já avançado em décadas, vejo a lista dos trabalhos, bem diversificados, os que fiz e os que estou fazendo. Os que saltam aos olhos, tomam a frente, ocupam quase todo os espaços, são as amizades. No currículo tinha que constar, além do trabalho, do local e do ano, as pessoas que fizeram parte dos períodos. Tenho, orgulhosamente, um currículo com muita gente querida. A maioria não vejo mais porque saiu do meu dia a dia ou eu que saí, mudaram de cidade ou foram para outra dimensão. Gente que nem imagina que gosto delas, que foram importantes, que lembro delas, gente que gosta de mim, me considera e às vezes nem sei se elas têm algum sentimento em relação a mim. Pessoas que muito ou pouco convivi, deixaram marcas porque, de alguma maneira, foram importantes me ensinando, me auxiliando, me atendendo, me apoiando. São muitos parceiros em projetos independentes, em escolas, empresas, órgãos públicos. São parentes que me abriram caminhos, me ajudaram em momentos de dificuldades e sei que posso contar sempre com eles.
Meu trabalho tem muito sobre a história da cidade, sobre os pioneiros. Sou fascinado pelas histórias dos primeiros maringaenses. Ao longo dos anos fiz muitas crônicas sobre eles, poesias, entrevistas. Em 1996, quando trabalhava na redação do O Diário do Norte do Paraná, tive a ideia do projeto “Maringá 50 anos”, que seria lançado no ano seguinte. Foi um trabalho marcante, de resgate, de homenagens. A partir dali fui me interessando mais pela história da nossa cidade e sua gente. E em 2017 fui convidado para participar do projeto que resultou em dois livros do “Maringá 70 anos”. Nestes anos todos, posso dizer que Maringá é a minha principal matéria-prima de trabalho.
Em 2014, a paixão pela história da cidade e pelo futebol se fundiram na minha vida. Primeiramente de forma tímida, com o passar dos dias foi se intensificando, possibilidades sendo ampliadas. Isto não surge do nada, não brota simplesmente. É algo que está ali há muito tempo, que vai se formando sem você saber. Só depois que acontece é que você vai na retrospectiva e encontra a explicação.
O Museu Esportivo de Maringá é a materialização de um sonho. O MEM é uma realidade porque muitos maringaenses, ainda que inconscientemente, também sonharam. São dez anos apenas, muito ainda por fazer, mas há um caminho traçado, um caminho sem volta.
Então, volto ao título benemérito. Penso que isso tem muito a ver com o Museu Esportivo e muito também da feliz convivência com os pioneiros famosos, conhecidos por toda a cidade, e com tantos queridos que o anonimato não os torna menos importantes. Escrevo sobre eles para que portas se abram para aquela Maringá dos anos 1940, 50, 60, 70 e eu possa visitá-la a partir dos depoimentos e daí compreender a formação deste lugar na sua essência. E, principalmente, compreender a história da minha família e a minha.
Venho pensando muito no meu pai nesses dias que antecedem a entrega do título. Se vivo estivesse, naturalmente estaria contente, mas tenho sérias dúvidas se iria à Câmara assistir à sessão solene. Algum neto certamente ligaria a TV Câmara no YouTube do celular dele, se é que ele teria celular. Ele diria pra minha mãe: “Vai lá, Ritinha, depois você me conta.” Com certeza ele comentaria com os vizinhos sobre o fato e, secretamente, se emocionaria. E quando estivesse sozinho em casa, faria rodar na mente o filme do jovem de 24 anos, da esposa de 20 e do filho com menos de 2 anos vindo de carona de caminhão da paulista Lupércio para Maringá, em 1959. A dona Rita, 85 anos, com saúde, graças a Deus, vai estar lá, ela nunca deixa de ir aos eventos que eu e a Simone promovemos.
Venho pensando muito nos meus avós que já partiram. Eles estão sepultados no Cemitério Municipal de Maringá. Meus avós paternos, Sebastião e Leonor, chegaram antes da gente, assim como tios. Os maternos, Jacinto e Maria, vieram depois, nos anos 1960. O Vô Bastião não era de sair de casa, gostava de deixar o rádio ligado nas alturas, cuidar da sua horta, das plantas e flores e ler seus jornais na hora de dormir. Então, acho, só acho, que não iria ver o seu neto mais velho receber o título, mas, dentro da sua sisudez, na sua peculiaridade, ficaria contente. O Vô Jacinto, quase cego, a humildade em pessoa, ficaria na varanda do fundo da casa de madeira da rua Floriano Peixoto, sentado, também ouvindo rádio e depois me perguntaria como tudo transcorreu. A Vó Maria ia ficar feliz com a notícia e acho até que poderia ir ver o seu neto predileto (pelo menos sempre achei que fosse o predileto) receber o título. A Leonor, que a gente sempre chamou de Vó Rolica, tenho absoluta certeza que iria. Sei disso porque no meu último dia do Tiro de Guerra, em outubro de 1976, ela foi. Tenho uma foto dela toda sorridente me vendo receber o certificado do Sargento Klein na sala de instrução do TG. Não iria neste evento? Siimm. Ela diria para a filha dela, a Léa, minha madrinha: “Léa, me leva na Câmara pra ver o Toninho.” A Vó, de olhos azuis como o céu, usaria um elegante conjunto verde claro, sapatos pretos, os brancos cabelos muito bem penteados, colocaria um cordão de ouro em volta do pescoço com um pingente de destaque e levaria sua emoção até a Câmara.
Venho pensando nesses anos todos que passaram voando. Daqui a pouco me torno um septuagenário. Envelhecer na cidade e receber o título de cidadania benemérita proporcionam essas intensas viagens pelo tempo e análises tais que não caberiam nessas páginas. Semana que vem volta tudo à normalidade porque é preciso seguir. Homenagens animam e com elas vêm a gratidão. Muito ainda por fazer. E graças a Deus quero fazer.
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(Antonio Roberto de Paula)
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